quarta-feira, 5 de agosto de 2020

ESTAS

são as semanas sombrias, desoladas
em que na sua aridez a natureza
iguala a estupidez do homem.

O ano submerso faz-se noite
e o coração submerge
mais fundo do que a noite

num sitio vácuo, varrido pelo vento
sem sol, sem lua nem estrelas,
só uma estranha luz como de pensamento

que incita um fogo obscuro -
a girar sobre si mesma até,
na frialdade, incendiar-se

para tornar um homem cônscio
de nada que saiba, não a própria
solitude - Não um fantasma mas

seria abraçado - vacuidade,
desespero - (Eles
silvam e soluçam) entre

os clarões e estrondos da guerra;
casas em cujos aposentos
o frio é maior do que se possa pensar,

partidas as pessoas a quem amávamos,
os leitos vazios, as poltronas
úmidas, as cadeiras sem uso -

Trata-se de esconder nalgum lugar
longe da lembrança, onde enraize
e cresça, a salvo dos ouvidos

zelosos e dos olhos - por si mesma.
Esta mina vêm eles escavá-la - todos.
Será isto a contraparte da música

mais suave? A fonte de poesia que
vendo o relógio parado, diz,
Parou o relógio que

ontem tiquetaqueava tão bem?
e ouve o som de água do lago
esparrinhando - pedras agora.

extraído de "Poemas Reunidos Completos" - 1938

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