quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Creio que Caravaggio usou a óptica da maneira mais hábil,
na prática desenhando com a câmara. Os novos tipos de espaço
vistos em suas obras são resultado de seu método de contrução,
que imagino, será um dia elaborado por historiadores de arte
com algum conhecimento de óptica, embora eu tenha uma idéia
intuitiva de como ele o fez. Devo advertir aqui que Caravaggio
não fez desenhos. Nenhum que se conheça, e os historiadores
não encontraram referências escritas a eles. Como, portanto,
ele realizou composições tão complicadas, sem erros nem
correções? Ele era de fato dotado de enorme talento,
mas tenho certeza de que contava também com uma ferramenta
que forneceu a base óptica a suas imagens.
Se observarmos essa pintura de Judite e Holofernes (1598),
podemos começar a ter uma idéia de como Caravaggio tal vez
tenha na verdade usado sua lente para criar seus quadros
cuidadosamente encenados. Em muitas de suas telas, inclusive nessa,
há uma quantidade de traços incisos feitos com a outra extremidade do pincel
em velatura úmida. Esses traços não acompanham as formas precissamente,
e não revelam muito ser desenhos composicionais: somente os elementos-
chave, a cabeça e os braços, são marcados. Creio que Caravaggio usou
essa técnica simplesmente para registrar a posição de seus modelos
e assim deixá-los descansar. Poderiam depois retomar suas posições,
e Caravaggio conseguiria projetar suas imagens e ajustar suas poses
até se acomodarem aos traços incisos. Ele não teria precisado, é claro,
que todos os seus modelos estivessem presentes ao mesmo tempo.
O quadro completo necessitaria apenas ser armado uma vez, para marcar
a composição global. Depois disso, os modelos poderiam vir um de cada
vez, á medida que ele trabalhase em diversas figuras. Os modelos de Caravaggio
nem sempre estão olhando para onde se esperaria, mas o pretenso objeto
de seus olhares não estaria lá!
extraido de "O Conhecimento Secreto" de David Hockney 

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