sábado, 18 de janeiro de 2020

CURSO DE ILUSTRAÇÃO EDITORIAL
A História Humana Contada Pela Arte
COLAGENS
LUIS TRIMANO
Série Propostas Gráficas - O Poema Ilustrado

"El Barco" - Edição virtual - Monte Alto - Rio de Janeiro - 2020
 

TRIMANO - PROPOSTAS GRÁFICAS


TRIMANO - PROPOSTAS GRÁFICAS

DESENHOS E ILUSTRAÇÕES DE LUIS TRIMANO

Duas coisas marcam especialmente esta exposição
de Luis Trimano na Galeria Macunaíma da Funarte, Rio:
a quase omissão da crítica e a coerência 
dos desdobramentos propostos no trabalho do artista.
A crítica de arte, com a notável exceção de Ferreira Gullar,
mais uma vez furtou-se a exercer a sua mais elementar
e fundamental função: informar e analizar a produção
estética na sua diversidade. Mas, o silêncio não chega
a surpreender: Trimano não é do "mercado de arte",
e seu trabalho desenvolveu-se à margem deste circuito.
A esfera em que seu trabalho se processou foi a dos jornais,
revistas e livros. Assim é, que o trabalho, iniciado em 1963,
na Argentina, junto as revistas Análisis, Panorama e Sete Dias Ilustrados tem, a partir de 1968 uma fecunda
continuidade junto à Folha de São Paulo, Jornal da Tarde, Veja, Última Hora, Realidade, Argumento, Fascículos da Música Popular Brasileira e sobretudo no jornal Opinião.
O destaque deste último periódico deve-se ao fato 
de que nele se congregavam todos aqueles que,
por diversos meios, estavam empenhados em criar
novas alternativas plásticas para a caricatura 
e a ilustração brasileira contemporâneas.
Por essa e por outras, é que falar em Trimano e também de certa forma falar de Cassio Loredano, Elifas Andreato,
Rubem Grilo e outros. 
O trabalho de Trimano não se esgota ao nível da leitura
rápida, simples e direta, da caricatura e da ilustração.
Sua atual exposição é o melhor testemunho disso:
os desenhos e colagens expostos exigem uma leitura
diametralmente oposta, detida, minuciosa, rica na sua multiplicidade de aspectos. 
A presente exposição, cuja ordenação é de exemplar
confluência com o nível de leitura proposta, transborda
os limites da caricatura e da ilustração transitando
para um espaço mais amplo e complexo. 
Nesse sentido, seu desenho, embora emergido da caricatura e da ilustração supera-lhe limites e propõe 
novas perspectivas de linguagem.
Apoiados numa sólida execução, em seus trabalhos
coexistem, num processo de retroalimentação 
muito interessante, o desenho e a colagem, o grafismo
na multiplicidade de suas posibilidades.

George Kornis
Tribuna da Imprensa
Rio de Janeiro
1979
 

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OPÇÃO JUSTIFICADA

Problemas de outra natureza determinam a opção
feita por Luis Trimano, com ampla experiência 
de desenhista, caricaturista e ilustrador de jornais,
revistas e livros. A sua carreira artística está assim
diretamente vinculada a uma atividade profissional intensa
e sujeita a limites que muitas vezes estão fora
de seu controle. Essa vinculação se foi, por um lado
estimulante, tornou-se mais tarde restritiva 
de sua necessidade de expressão, levando-o a procurar
um espaço próprio, mais livre, onde exercê-la.
Os vinte e oito trabalhos que constituem a presente mostra
de Trimano na Galeria Macunaíma, Rio, embora emoldurados como desenho ou gravura, guardam
a configuração de páginas duplas de livro, 
tendo de um lado o texto  e do outro a ilustração 
correspondente. Essa disposição repetitiva provoca
certa monotonia mas se explica pelo propósito do autor
de reunir aqueles trabalhos num album, onde encontrarão
sua efetiva funcionalidade.
Superada essa primeira impressão a linguagem gráfica
do artista revela toda sua força expressiva, onde as imagens
da vida urbana e do cotidiano mais vulgar 
são transfiguradas pelo processo de montagem, criando-se
uma atmosfera de sonho ou pesadelo. Os textos que servem
supostamente de fonte inspiradora das ilustrações
funcionam não apenas como texto literário mas também
como composição gráfica esteticamente valorizada.
A opção feita por Trimano está justificada.

Ferreira Gullar
Revista Veja
Rio de janeiro, 30 de maio de 1979 

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TRIMANO PROPOSTAS GRÁFICAS

A ÁRVORE

Esta árvore e o seu frémito
sombria floresta de apelos,
de gritos,
devora
o obscuro coração da noite


Vinagre e leite, o céu, o mar
a massa espessa do firmamento,
tudo conspira no estremecimento
que habita o denso coração da sombra


Um coração aberto, um astro duro
que em dois se divide e no céu se difunde,
o límpido céu fendido
no instante do sol nascente
fazem todos o mesmo ruído
que a noite e a árvore no centro do vento

Antonin Artaud
 

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MEDITACIÓN EN EL SUBTERRANEO

Aquí al princípio de la nueva estación
antes que las hojas nuevas retoñen,
a cada lado de la estación East Parkway
cerca de los jardines botánicos
queman la basura en terraplenes, dejando
mas desnudo a nuestro triste y civilizado deshecho


1 lata de café sin tapa
1 pinta vacia de White Sar, la marca desteñida por la lluvia
1 lata vacia de cerveza
2 botellas vacias de Shenkey
1 condon vacio, visto desde
1 tren casi vacio
vacio
vacio
vacio
repetida asi la palabra
hasta parece graciosa

Paul Blackburn

 

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A ÁRVORE ENVENENADA

Sentia raiva de um companheiro
confessei o ódio, o ódio se foi inteiro
sentia raiva de um inimigo
fiquei calado, o ódio vi crescido


E o reguei de alma sombria
com meu pranto noite e dia
e escondido sob sorrisos gentis
e com corteses, enganosos ardis


E cresceu noite e manhã
até florescer luzente maçã
ao ver o brilho que ela tinha
o inimigo sabia que era minha


E foi ao meu jardim roubar
quando a noite velou o pomar
bem cedo vi, com agrado
o inimigo sob a árvore esticado

William Blake
 

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SOPRANDO COM O VENTO

Quantas estradas um homem precisará andar
até que possam chamá-lo de homem?
sim, e quantos mares uma pomba branca precisará
sobrevoar
até que possa dormir na areia?
sim, e quantas balas de canhão precisarão voar
até serem para sempre banidas?
a resposta, meu amigo, está soprando com o vento
a resposta está soprando com o vento


sim, e quantos anos uma montanha pode existir
antes que seja disolvida pelo mar?
sim, e quantos anos algumas pessoas podem existir
até que sejam permitidas ser livres?
sim, e quantas vezes um homem pode virar sua cabeça
e fingir que simplesmente não vê?


a resposta, meu amigo, está soprando com o vento
a resposta está soprando com o vento


quantas vezes um homem precisará olhar para cima
até que possa ver o céu?
sim, e quantas orelhas um homem precisará ter
até que possa ouvir as pessoas chorar?
sim, e quantas mortes ele causará até saber
que pessoas demais morrerão?
a resposta, meu amigo, está soprando com o vento
a resposta está soprando com o vento

Bob Dylan

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LA CALLE LARGA

Esta larga calle
que es la calle del mundo
pasa a través del mundo
llena de toda la gente
del mundo
para no mencionar todas
las voces
de toda la gente
que alguna vez existió.

Lawrence Ferlinghetti

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IESSÊNIN

Es mejor morir de vodka,
que de aburrimiento.
No revelaran la causa de esta pérdida,
ni la cuerda
ni el puñal suicida.
Tal vez,
si hubiese tinta en el hotel Inglaterra
no tendria razones,
para cortarse usted las venas.
Los imitadores se alegraron:
Bis!
contra él,
casi un pelotón entero,
pareciera haber realizado el atentado.
Para que aumentar
el número de suicidas?
mejor aumentar
la cantidad de tinta.
Ahora,
se cerraron sus labios,
para siempre,
inoportuno,
y penoso,
es hablar de estos misterios.

Vlamir Maiakovski

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E A MORTE NÃO TERÁ DOMÍNIO
trecho

...E a morte não terá domínio.
Os gritos das gaivotas não mais se ouvirão
nem as ondas altas quebrarão nas praias.
Onde uma flor brotou não poderá outra flor
levantar a cabeça às lufadas da chuva;
embora sejam loucas e mortas como pregos,
testas tenazes martelarão entre margaridas:
irromperão ao sol até que o sol se rompa,
e a morte não terá domínio.

Dylan Thomas

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ONDE A MENTE É LIVRE DE MEDO

Onde a mente é livre de medo e a cabeça 
se mantém erguida
onde o conhecimento é livre
onde o mundo não foi retalhado em fragmentos
por estreitas paredes domésticas
onde as palavras emergem das profundezas da verdade
onde o esforço incansável estende os braços
em direção à perfeição
onde o claro mo da razão não perde o rumo
nas tristes areias desertas dos hábitos estagnados;
onde a mente é impelida por ti
rumo ao pensamento e a ação cada vez mais amplos
nesse paraíso de liberdade. Pai, permita que meu país desperte.

Rabindranath Tagore

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LA PAZ, LA AVISPA, EL TACO, LAS VERTIENTES

La paz, la avispa, el taco, las vertientes,
el muerto, los decílitros, el buho,
los lugares, la tiña, los sarcófagos, el vaso las
morenas,
el desconocimiento, la olla el monaguillo,
las gotas, el olvido,
la potestad, los primos, los arcángeles, la aguja,
los párrocos, el ébano, el desaire,
la parte, el tipo, el estupor, el alma...


dútil, azafranado, externo, nítido,
portátil, viejo, trece, ensangretado,
fotografiadas, listas, tumefactas,
conexas, largas, encintadas, pérfidas...


ardiendo, comparando,
viviendo, enfureciéndose,
golpeando, analizando, oyendo, estremeciéndose,
muriendo, sosteniéndose, situándose, llorando...


después, éstos, aquí,
después, encima,
quizá, mientras, detrás, tanto, tan nunca,
debajo, acaso, lejos,
siempre, aquello, mañana, cuánto,
cuanto!...


lo horrible, lo suntuário, lo lentísimo,
lo augusto, lo infructuoso,
lo aciago, lo crispante, lo mojado, lo fatal.
lo todo, lo purísimo, lo lóbrego,
lo acerbo, lo satánico, lo táctil, lo profundo...

César Vallejo
 

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BLUES DA CHUVA

Aguacero
belo músico 
aos pés de uma árvore desfolhada
em meio as harmonias perdidas
junto de nossas memórias derrotadas
em meio às nossas mãos de derrota
e dos povos de estranha força
deixamos abaixar nossos olhos
a nascer
desatando as cordas de uma dor
nós choramos

Aimé Césaire
 

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UIVO
trecho

Eu vi as mentes mais brilhantes da minha geração destruídas pela
loucura, famintas histéricas, nuas,
a arrastarem-se na aurora pelas ruas de negros
em busca de uma
dose feroz,
gingões de angélicas cabeças ardendo pelo velho
contato celeste
com o dínamo estelar da maquinária da noite,
que de miséria e andrajos e olhos cavos e alucinados
se sentavam
a fumar na penumbra sobrenatural de quartos 
de águas frias
flutuando pelos cumes das cidades contemplando o jazz...

Allen Ginsberg 

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ÚLTIMA CARTA DE VINCENT VAN GOGH
AO IRMÃO THEO

"Nunca me preocupei em reproduzir exatamente
aquilo que vejo e observo. A cor serve para me exprimir, Theo: amarelo terra, azul corvo, lilás sol, branco pomar,
vermelho Arles... Sulfurosas cores cintilando sob o mistério
das estrelas na profunda noite afundadas onde me alimento
de café, absinto, tabaco, visões e um pedaço de pão,
que o padeiro teve a bondade de fiar. 
O mistral sopra mesmo quando não sopra, os pomares
estão em flor, o mistral torna-se nas copas das ameixeiras,
Arles continuou a arder quando tentei matar aquele que viu
a minha paleta tornar-se límpida, mas acabei por desferir
um golpe contra mim mesmo.
Theo, cortei-me uma orelha, e o mistral sopra agora só
de um lado do meu corpo, os pomares estão em flor
e Arles, Theo, continua a arder sob a orelha cortadas...
Por fim Theo, em Auvers voltei a cara para o sol apontando
o revólver ao peito, senti o corpo como um torrão de lama
em fogo regressar ao início num movimento de incendiado
girassol."

Vincent
23 de julho de 1890

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