quinta-feira, 26 de junho de 2014

TAMAYO - Retrato de Jean Dubuffet - óleo 1972


TAMAYO


TAMAYO


TAMAYO


TAMAYO


TAMAYO - "Duas Figuras em Vermelho" - óleo 1973


TAMAYO - "A Grande Galaxia" - óleo 1978


CURSO DE ILUSTRAÇÃO EDITORIAL
SOBRE A LIBERDADE NA ARTE
ANDREI TARKOVSKI

JACKSON POLLOCK


Os critérios que distinguem arte e não-arte, arte e impostura, são certamente tão relativos, vagos e impossíveis de demonstrar, que nada seria mais fácil que substituir os critérios estéticos por métodos de avaliação puramente utilitários, que podem ser ditados tanto pelo desejo do maior lucro financeiro possível quanto por um motivo ideológico qualquer.
Ambos estão igualmente distantes dos verdadeiros objetivos
da arte. A arte é, por natureza, aristocrática e seletiva
em seus efeitos sobre o público. Pois, mesmo em suas manifestações "coletivas", como o teatro ou o cinema,
esses efeitos estão associados às emoções mais íntimas
de cada pessoa que entrar em contato com a obra. Quanto
mais um indivíduo se deixa prender e afetar por suas emoções, mais significativo será o lugar ocupado pela obra
em sua experiência.
No entanto, a natureza aristocrática da arte de forma alguma
exime o artista da responsabilidade para com seu público
e até mesmo, se assim preferirem, para com as pessoas em geral. Pelo contrário: em função da conciência especial
que tem do seu tempo e do mundo em que vive, o artista
torna-se a voz daqueles que não podem expressar
sua concepção da realidade. Nesse sentido, o artista
é realmente vox populi. 
Esta é a razão pela qual ele é chamado a contribuir 
com o seu talento, o que significa servir ao seu povo.
Não consigo de modo algum entender o problema da chamada "liberdade" ou "falta de liberdade" de um artista.
Ele nunca é livre. A nenhum grupo de pessoas falta mais liberdade. O artista está preso ao seu dom, à sua vocação. Por outro lado, ele é livre para escolher entre expressar
seu talento da maneira mais plena que puder, ou vender
sua alma por trinta moedas de prata. A frenética busca
de Tolstoi, Dostoievski e Gogol não foi estimulada
pela consciência que tinham da sua vocação e do papel
que lhes estava destinado?
Também estou convencido de que nenhum artista trabalharia para cumprir sua missão espiritual se soubesse
que sua obra jamais seria vista por alguém. Ao mesmo tempo porém, sempre que estiver trabalhando, ele deve colocar um véu entre ele e as outras pessoas, para se proteger contra a abordagem de temas genéricos, vazios 
e triviais. Pois a concretização das possibilidades criativas
de um artista só pode ser obtida através de honestidade
e sinceridade totais, aliadas à consciência de sua própria
responsabilidade para com os outros.
Ao longo da minha carreira, fuí muitas vezes acusado
(uma acusação feita com muita frequência) de "ter-me distanciado da realidade", como se eu houvesse me isolado
conscientemente dos interesses cotidianos do povo. Devo
admitir, com toda sinceridade, que nunca entendí 
o significado dessas acusações. 
Não será idealismo imaginar que um artista, ou qualquer outra pessoa, seja capaz de se marginalizar da sua sociedade e do seu tempo, de se "libertar" do tempo e do
espaço em que nasceu? Sempre pensei que qualquer pessoa, e qualquer artista (por mais distantes que possam
ser as posições estéticas e teóricas dos artistas contemporâneos) deve ser necessariamente um produto
da realidade que o cerca. Um artista pode ser acusado
de interpretar a realidade a partir de um ponto de vista inaceitável, mas isso não é o mesmo que isolar-se dela.
Sem dúvida, cada pessoa expressa seu próprio tempo
e traz dentro de si as leis do seu desenvolvimento, embora
nem todos se sintam inclinados a levar em consideração
essas leis ou a encarar os aspectos da realidade que não
lhes agradam. A arte, como afirmei anteriormente, atinge
as emoções de uma pessoa, não sua razão. Sua função,
por assim dizer, é modificar e libertar a alma humana,
tornando-a receptiva ao bem. Quando vemos um bom filme,
admiramos uma pintura, ou ouvimos música (partindo do
pressuposto de que se trata do "nosso" tipo de arte) ficamos
desarmados e arrebatados já de início - mas não por uma
idéia, nem por um conceito. De qualquer modo, como
dissemos antes, a concepção de uma grande obra é sempre
ambígua, sempre tem duas faces, como diz Thomas Mann,
ela é multifacetada e indefinida como a própria vida. O autor
não pode, portanto, esperar que sua obra seja entendida
de uma forma específica e de acordo com a percepção
que tem dela. Tudo o que pode fazer é apresentar sua própria imagem do mundo, para que as pessoas possam
olhar esse mundo através dos seus olhos e se deixem
impregnar por seus sentimentos, dúvidas e idéias...
texto extraído do livro "Esculpir o Tempo"
editora Martins Fontes - 1990