quarta-feira, 25 de julho de 2012

Uma leve brisa de esperança invadiu o meu interior.
Atravessei a primeira porta que alcancei no meio
da escuridão e no avançar, sem saber a razão,
senti que titubeava, ao mesmo tempo em que tirava
inconscientemente de um dos bolsos uma caixa
de fósforos e ascendia a chama.
Esqudrinhei a habitação, quando ouvi alguns passos
que se atropelavam pelos corredores.
O sangue desapareceu do meu corpo, mas não a ponto
de deixar apagar a chama que acabara de acender.
Meu pai, tal como o encontrara naquela tarde,
apareceu no umbral da porta seguido de alguns seres
sinistros que rosnavam de forma grotesca. Apagaram
de imediato a luz que eu trazia, e gritaram misteriosamente:
- Luz, luz!... Uma estrela!
Fiquei paralisado e sem palavra.
Mas, com um gesto intempestivo, consegui reaver as forças
e gritar desesperado:
- Pai! Recorda que sou teu filho! Não estás doente!
Não podes estar doente! Para com esse grunhido selvagem!
Não és um macaco! És um homem, oh, meu pai!
Somos todos homens!
E acendí outro fósforo.
Uma gargalhada apunhalou-me o coração. E meu pai falou
com uma lástima dilacerante, pleno de comiseração infinita.
- Coitado, pensa que é um homem. Está louco...
E fez-se escuridão outra vez.
Arrebatado pelo espanto, distanciei-me do grupo tenebroso,
a cabeça girando.
- Coitado! - exclamaram todos - Está completamente louco!...
- E aqui estou - acrescentou com pesar o homem que fizera
esta narraçãqo curiosa.
Aproximou-se então um empregado de uniforme amarelo
e fez um gesto para que o seguisse, ao mesmo tempo
em que nos saudava, despedindo-se e falando para os lados:
- Boa tarde, agora precisa ir para o seu quarto, boa tarde.
E o narrador demente dessa história desapareceu junto com
o seu enfermeiro  que o guiava entre os verdes choupos 
do manicômio, enquanto o mar murmurava amargamente
e os pássaros lutavam entre si na espádua agonizante da tarde...
Extraído do livro de relatos "Paco Yunque" - tradução: Jorge Simões

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