sexta-feira, 12 de novembro de 2010

1905 - Vai se estendendo, pelo mundo, a noção de que há umas certas raças superiores e outras inferiores, e que essa inferioridade, longe de ser transitória, é eterna e intrínseca à própria estrutura da raça. / Diz-se ainda mais: que as misturas entre essas raças são um vicio social, uma praga e não sei que cousa feia mais. / Tudo isto se diz em nome da ciência e a coberto da autoridade de sábios alemães. / Eu não sei se alguém já observou que o alemão vai tomando, nesta nossa lúcida idade, o prestígio do latim na Idade Média. / O que se diz em alemão é verdade transcendente. Por exemplo, se eu dissesse em alemão - o quadrado tem quatro lados - seria uma cousa de um alcance extraordinário, embora no nosso rasteiro portugués seja uma banalidade e uma quase-verdade. // E assim a cousa vai se espalhando, graças a fraqueza da crítica das pessoas interessadas, e mais do que à fraqueza, à covardia intelectual de que estamos apossados em face dos grandes nomes da Europa. Urge ver o perigo dessas idéias, para nossa felicidade individual, e para nossa dignidade superior de homens. Atualmente, ainda não saíram dos gabinetes e laboratórios, mas amanhã, espalhar-se-ão, ficarão à mão dos políticos, cairão sôbre as rudes cabeças da massa, e tal vez tenhamos que sofrer matanças, afastamentos humillantes, e os nossos liberalíssimos tempos verão uns novos judeus.

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