segunda-feira, 5 de agosto de 2019

PROPOSTAS GRÁFICAS - O POEMA ILUSTRADO - ANTONIN ARTAUD

VAN GOGH - O SUICIDADO PELA SOCIEDADE
Post-Scriptum

Van Gogh não morreu por causa de uma indefinida
condição delirante,
mas por ter chegado a ser corporalmente o campo de ação
de um problema, em cujos redores se debate, 
desde as origens, o espírito inócuo desta humanidade,
e do predomínio da carne sobre o espírito, ou do corpo
sobre a carne, ou do espírito sobre um e outro.
E onde está neste delírio o lugar do eu humano?
Van Gogh procurou o seu durante toda a sua vida,
com energia e determinação excepcionais.
E não se suicidou num ataque de insânia, pela angustia 
de não chegar a encontrá-lo,
ao contrário, acabava de encontrá-lo, e de descobrir
que era e quem era ele mesmo, quando a inconscência
geral da sociedade, para castigá-lo, por tê-lo afastado dela,
o suicidou.
E isto aconteceu a Van Gogh, como acontece habitualmente,
por motivo de um bacanal, de uma missa, 
de uma absolvição, ou de qualquer outro ritual
de consagração, de possessão, de sucubação
ou de incubação.
Assim introduziu-se no seu corpo
esta sociedade
absolvida
consagrada
santificada
e possuída
apagou nele a consciência sobrenatural que acabava
de adquirir, como uma inundação de corvos negros,
nas fibras de sua árvore interna,
o submergiu numa última onda,
e tomando seu lugar,
o matou.
Pois está na lógica anatômica do homem moderno,
não ter podido jamais viver nem pensar em viver,
senão como possuído.

Antonin Artaud
Marselha, França 1896 - Ivry-sur-Seine, França 1948

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