sábado, 26 de maio de 2018

- Nos mares do norte, encontramos uma vez um barco a vela como o Maria Madalena.
- Nosso rumo - viajávamos também com velas - nos levou 
ao seu lado.
O singular aspecto de abandono que não engana num navio,
chamou-nos a atenção, e diminuimos a marcha 
observando-o. Finalmente mandamos uma chalupa,
a bordo não se achou ninguém, e tudo estava também
em perfeita ordem. A última anotação do diário datava
de quatro dias atrás, de tal forma que não sentimos
maior impressão. Ainda rimos das famosas desaparições súbitas. Oito dos nossos homens ficaram a bordo
para o governo do novo navio. 
Ao anoitecer se distanciou um pouco.
No dia seguinte o alcançamos mas não vimos ninguém
sobre a ponte. Mandamos novamente uma chalupa,
e os que foram percorreram em vão o navio: todos haviam
desaparecido. Nenhum objeto fora de lugar. O mar estava
absolutamente calmo em toda a sua extensão.
Na cocinha fervia ainda uma panela com batatas.
Como vocês compreenderão, o terror supersticioso
da nossa gente chegou ao cúmulo. Seis se animaram
a preencher o vazio, e eu fui com eles.
Chegados a bordo, meus novos companheiros decidiram beber para afastar toda preocupação. Estavam sentados
em círculo, e pouco depois a maioria começaram a cantar.
Chegou o meio-dia e passou a sesta.
As quatro chegou a brisa e as velas foram arriadas.
Um marinheiro acercou-se à borda e olhou o mar 
sujo de óleo. Todos tinham acordado, e se paseavam,
sem vontade de falar. Um sentou-se num cabo enrolado
e despiu a camiseta para remendar, costurando em silêncio.
De repente se levantou e soltou um longo asobio.
Seus companheiros se voltaram para olhar. Ele os olhou
sorpreendido também e sentou-se de novo. 
Um momento depois deixou a camiseta, avanzou 
até a borda e se jogou no mar.
Ao ouvir o ruído, os outros se voltaram com gesto
preocupado. Logo se esqueceram e voltaram à apatia geral.
Outro se espriguiçou, esfregou-se os olhos, 
e se jogou no mar.
Passou meia hora; o sol ia decaindo.
Senti que me tocavão no ombro.
- Que horas são? -
- As cinco - respondí
O velho marinheiro que me fez a pergunta me olhou
desconfiado, com as mãos enfiadas nos bolsos,
se recostando na minha frente. Olhou por um momento
a minha calça, distraído. E por fim se jogou nas águas.
Os três que ficaram se aproximaram rapidamente
e observaram o redemoinho. Se sentaram na borda
assobiando com o olhar perdido ao longe. Um se abaixou
e deitou-se na ponte, cansado. Os outros desapareceram
um atrás do outro.
As seis o último levantou-se sonolento, e se jogou
nas águas. 
E o acontecido ao Maria Margarida, que zarpou de New York
o 24 de agosto de 1903, e que no dia 26 se comunicou
com outro navio e depois cessou toda informação?
Quatro horas mais tarde, não obtendo resposta, foi enviada
uma chalupa que abordou o Maria Margarida. No navio
não tinha ninguém. 
As camisetas dos marinheiros foram postas na proa 
para secar. O fogão da cocinha ainda estava aceso.
Uma máquina de costura estava com a agulha suspensa
sobre a costura, como se tivesse sido deixada um momento antes. Não havia o menor sinal de luta nem pânico,
tudo em perfeita ordem. E faltavam todos. Que acontecera?
Na noite que aprendí isto estávamos reunidos na ponte.
Íamos a Europa, e o capitão nos contava sua história
marítima, perfeitamente certa, sem lugar a dúvidas.
As moças ouviam estremecidas, sugestionadas pelas ondas
susurrantes, nervosas prestavam, sem querer, atenção
à voz rouca dos marinheiros na proa.
Uma senhora muito jovem, recém casada se atreveu a dizer:
- Não serão águias?...-
O capitão sonriu bondosamente:
- Como assim? - águias se levam a tripulação?
Todos riram e também a jovem, um pouco envergonhada.
Felizmente um passageiro sabia algo disso. O olhamos
com curiodidade. Durante a viagem tinha sido um exelente
companheiro, assistindo a tudo e falando pouco.
- Ah! se o senhor nos contasse! -
Suplicou a jovem das águias
- Sem problema algum.-
Assentiu o discreto individuo.

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