sexta-feira, 17 de maio de 2013

Na segunda metade do século XIX ter um retrato fotográfico
havia se tornado um dos grandes desejos do homem.
Imagens capazes de perpetuar para as futuras gerações
o semblante de alguém, tal qual o reflexo em um espelho,
mobilizaram e exitaram o imaginário de grande parte da sociedade ocidental.
Deixar-se fotografar naquela época de avanço da industrialização
e aceleração das metrópoles era um gesto inovador
que espelhava o desejo coletivo de expansão e modernidade,
ao mesmo tempo em que se tornava um contraponto
à representação que a pintura havia feito até então da nobreza,
que hoje vemos nos museus mundo afora.
No entanto os primeiros retratos fotográficos realizados
nos estúdios pioneiros da Europa muitas vezes decepcionavam os clientes.
O longo tempo de exposição necessário para obter um retrato,
ocasionado pelos materiais pouco fotossensíveis da época,
obrigava os retratados a ficar imóveis durante longos minutos,
em verdadeiras sessóes de tortura.
O resultado era, invariavelmente, frustrante.
No mais, para as gerações que foram acostumadas aos retratos
idealizados da pintura, nos quais os artistas eram obrigados a embelezar
com pinceladas generosas seus clientes, a fotografia se mostrava cruel,
já que revelava todas as imperfeições do cliente.
Esse foi um dos motivos que tornaram urgente a criação de uma artimanha
para maquiar seu realismo bruto. Assim, em 1885, apenas dezesseis anos
após a invenção oficial da fotografia, o alemão Franz Seraph Hanfstaengl,
de Munique, espantou o mundo ao apresentar na Exposição Universal de París,
a primeira em que fotografias foram expostas, sua técnica de retocar imagens.
Ao mostrar a mesma fotografia com e sem retoque, Hanfstaengl descortinou
a possibilidade de esse "espelho mágico" simular uma situação, ou seja,
criar uma nova "realidade".
A partir da invenção do retoque em preto-e-branco, sobre o papel fotográfico,
pesquizadores passaram a investigar a possibilidade de fazer o mesmo
com tintas coloridas, para mimetizar as cores da natureza, aumentando
o grau de realismo das fotografias.
Historiadores localizam a criação do processo de fotopinturas em torno 
de 1863. Seu criador teria sido André Adolphe Eugène Disdéri (1819-1889),
que, a partir de uma base fotográfica em baixo contraste, aplicou tintas
para dar cores às imagens. Nesse processo, a fotografia se tornou, então,
um esboço das formas, um facilitador na execução do retrato que poupava
o pintor de ter de realizar o desenho do semblante do cliente.
Temos, portanto, de um lado, a pintura criando uma visualidade que tende
a ser mais criativa e idealizada, enquanto, de outro, a base fotográfica serve
como um parámetro, um limitador que cerceia a excessiva criatividade
do fotopintor, dado que a verossimilhança com o retratado deve ser mantida,
sob pena de o trabalho ser devolvido e não pago.
Uma fotopintura, portanto, traz nas suas duplas camadas o embate histórico
da representação que tem a pintura e a fotografia como protagonistas.
Desde o inicio deste novo século o oficio de fotopintores praticamente deixou
de existir desta forma artesanal. Com a chegada das câmeras digitais
e a dificuldade cada vez maior em obter filmes e papel fotográfico, alguns poucos
migraram para realizar às fotopinturas em computadores, mas a esmagadora
maioria teve que trocar de oficio.

EDER CHIODETTO
extraído do catálogo da exposição "fotopinturas" / coleção Titus Riedl
Galeria Estação - São Paulo - Brasil 2011










   

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